Um Jovem, o Velho e um Livro
Abstract
Ontem o Velho morreu. Dizem que ele passara dos noventa anos sem perder a noção do espaço e do tempo. Sempre usava um paletó branco e encardido, na lapela, um broto de antúrio que, de longe, parecia um objeto vermelho cravado no lado esquerdo do peito. De perto, o broto invocava um membro diminuto e obsceno que irradiava comentários maldosos. Sabíamos pouco de sua vida: era um professor aposentado, solteirão e invisível nas noites de Manaus. Aos sábados, visitava filhos e netos de amigos, porque os amigos, mesmo, já repousavam no fundo do rio, como ele costumava dizer. Fazia tempo que eu não o via, e não sei se ele teria reconhecido um dos meninos que o rodeavam para ouvir sua voz. Eu o conheci em 1964, quando ele sentava em um banco da praça Balbi, contava histórias, gracejava com as garças.